sexta-feira, 19 de abril de 2013

Saudades eternas

- Eu não acredito que ele se foi, tão jovem. - Dizia Emily entre lágrimas de dor ao debruçar-se sobre o caixão de seu pai.
- Acalme-se Emily, ele está em um lugar melhor. - Disse seu irmão Derek, tentando acalma-la. Fiquei olhando o casal de irmãos se consolarem em meio a tantas mágoas exibidas naquele simples velório. Ninguém entendeu o motivo do caixão fechado, o dono da funerária local decidiu assim, contrariando a vontade da desconsolada família.
   Foi tudo tão rápido, estava tudo tão bem, eu me lembro muito bem como se fosse hoje.
   Alan era um homem poderoso em sua cidade local, dono de uma loja automotiva, andava sempre bem trajado com direito a terno e gravata. Ao passar dos meses, Alan havia criado uma obsessiva adoração por um certo veículo em sua loja, um Porshe 550, Não podíamos negar que era uma peça valiosa para quem é fã de automotores, mas sua paixão já estava, digamos, que doentia. Meu nome é Trevor, moro numa pequena cidade do interior situada no estado de Ohio. Eu trabalhava na loja de Alan, quando eu fui admitido ele parecia ser um homem honesto e simpático, pacientemente me explicou meus afazeres e as regras do local. Os anos se passaram quando eu fui ganhando sua confiança dentro da loja e me tornei seu braço direito, sempre me convidava para jantar em sua casa e conhecer sua família, nas vezes em que eu fiz honra aos seus convites e compareci, parecia que ele queria empurrar sua filha para um relacionamento comigo, realmente ele gostava bastante de mim, mas por outro lado eu não via maldade alguma nas suas atitudes, agora parado aqui olhando para Emily e seu irmão veio a tona todos os momentos em que eu vivenciei a vida de Alan, tanto nos momentos de trabalho quanto nos de lazer.
  Alan sempre quis me ensinar tudo que ele sabia, desmerecendo seu filho que também fazia parte da nossa equipe empreendedora, eu sentia pena do garoto, ele tinha orgulho do pai e queria ser como ele mas parece que apenas eu enxergava assim.  Um certo dia, chegou um homem de muletas na loja, eu atendi ele e perguntei em que eu poderia ajudá-lo, o homem abaixou a cabeça passado alguns segundos me olhou nos olhos e perguntou: 
- Vocês compram carros aqui? 
-Bom, depende do estado do veículo, marca, ano, documentos pagos etc. - Respondi meio confuso com a pergunta, já que nossos veículos eram totalmente novos, ninguém havia oferecido um semi-novo para compra antes.
- Tenho um porshe 550, uma raridade todos os documentos em dia, parecendo novo, mal utilizei ele, acabei reformando mas não tive oportunidade de andar muito.
Uma boa proposta, pensei - Vou chamar o gerente, só um minuto - Disse apressado saindo do saguão de carros. 
 Bati na porta que logo se abriu, contei para Alan do carro e disse minha opinião, seria uma bela oportunidade para venda já que fazia tempos que havia notado que ele admirava carros antigos.
 Alan então se dirigiu ao saguão e conversou com o homem, acabou comprando o veículo, pediu-me para que eu fosse com o estranho pegar o carro e leva-lo para a loja, assim fiz. Chegando na casa, ele me pediu para esperar do lado de fora enquanto pegava as chaves, fiquei esperando enquanto analisava o veículo, realmente estava impecável, brilhando como ouro e diamante, dava até vontade de rodar com ele.
- Aqui está - Disse ele se apoiando em sua bengala e me entregando a chave.
Estendi a mão olhando em seus olhos quando de repente ele segurou forte as chaves já em minha mão e disse - Cuide bem dele, eu realmente vou sentir muitas saudades - Estranhei, mas entrei no carro e fui a caminho da loja para que fosse posto a venda, enquanto dirigia notei um leve desvio na direção, ela simplesmente girava para o lado contrário ao que eu queria ir, mas como o carro era bem antigo não tinha direção hidráulica pensei que pudesse ser coisa da minha cabeça. Chegando lá, estacionei o veículo e entreguei as chaves para Alan guardar em seu escritório. Passou algum tempo e vi que Alan passava horas de seus dias admirando e limpando esse novo carro na loja. Ele nunca havia dirigido, era política na empresa não sair com o carro da loja uma vez que já estava a venda. Ele estava ficando obcecado, eu tinha notado pois Derek em fase de adolescência havia ficado rebelde com ciúmes da relação quase fraternal de Alan comigo. Certa noite Alan ficou até mais tarde na loja trabalhando e eu decidi sair para jantar fora em uma lanchonete que ficava perto da loja, ao passar por ela, notei que Alan estava dentro do Porsche sentado com as mãos ao volante, estava bastante escuro mas pude perceber sua presença dentro do carro. Como Alan estava doente pelo carro, decidi não atrapalhar seu momento de nostalgia, talvez me pudesse custar o emprego tal ação.
  E essa foi a última vez que vi Alan vivo, na manhã seguinte foi encontrado morto dentro do carro em chamas duas quadras depois da loja. Fui chamado para reconhecer seu corpo praticamente carbonizado, percebi que havia uma parte intacta, suas mãos. Reconheci pelo relógio que usava sempre, dizia que lhe dava sorte e ainda estava em seu pulso, enquanto sua família cuidava do velório e enterro, eu estava atordoado demais, passei a noite sem dormir, não tirava da cabeça a cena de Alan queimado em uma cama de hospital, voltei pra casa e tinha alguém sentado em frente a escada da porta de entrada por coincidência era o homem que nos havia vendido o Porsche, ele me olhou e disse:
- Eu avisei para tomar cuidado. - E saiu andando.
Meu estado emocional estava tão abalado que não tive forças para ir atras do homem e indagar a sua frase. Deitei no sofá e não contive o choro, acabei caindo no sono ali mesmo. Duas horas depois eu acordei um tanto cansado ainda, tomando uma xícara de café pensativo decidi ir atrás do homem para lhe questionar o mistério do carro, para minha surpresa ao bater na porta uma mulher atendeu me dizendo que este homem havia morrido Há 10 anos e o carro a qual eu me refiria a ela havia sumido quando ele morreu, essa mulher era esposa do homem e disse que estava viajando na semana em que eu disse que foi efetuada a compra do carro.
 Por isso digo a quem quiser ouvir que entendo a dor da família de Alan.


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